quarta-feira, 8 de junho de 2011

Nova apresentação da Restauração dos Algarves ou os Heróis de Faro e Olhão



Fazemos aqui um parêntesis na ordem cronológica que estamos a tentar seguir para avisarmos os interessados que vai decorrer uma nova apresentação pública duma obra publicada em 1809 e recentemente reeditada, intitulada "Restauração dos Algarves ou os Heróis de Faro e Olhão". Os vídeos da anterior apresentação (que decorreu em Faro) podem ser consultados aqui.

Deixamos abaixo o texto do convite da APOS, associação que teve a iniciativa de concorrer com este texto (revisto, actualizado, anotado e prefaciado pelo autor das presentes linhas) a um prémio de apoio à edição promovido pela Direcção Regional de Cultura do Algarve, facto que permitiu (juntamente com os outros apoios abaixo mencionados) a reedição desta obra:


A APOS (Associação de Valorização do Património Cultural e Ambiental de Olhão) convida para no próximo dia 18 de Junho (sábado) de 2011, pelas 16h, comparecerem à apresentação do livro histórico "Restauração dos Algarves ou os Heróis de Faro e Olhão", na Sociedade Recreativa Olhanense (Av. da República, nº 14, Olhão)
O livro em causa é uma peça de teatro de Luís de Sequeira Oliva, escrita em 1809, sobre a revolta ocorrida no Algarve uns meses antes, contra as tropas napoleónicas da 1ª Invasão Francesa.
O início desta revolta foi em Olhão em 16 de Junho de 1808, na época uma pequena aldeia de pescadores sem aristocracia, e que depois se alastrou a Faro e, finalmente, a todo o Algarve. Chamamos a atenção para a importância deste momento histórico para o Algarve, pois que esta 1ª Invasão Francesa foi a única ocupação por tropas estrangeiras que aqui ocorreu, desde que a província é portuguesa.
Edgar Cavaco encontrou esta peça de teatro nos arquivos da Biblioteca Nacional e foi o responsável pela adaptação e contextualização da obra. A APOS (Associação de Valorização do Património Cultural e Ambiental de Olhão) e a editora Licorne, com o apoio primeiro da Direcção Regional da Cultura do Algarve e da Câmara Municipal de Faro, e recentemente da de Olhão, publicou o livro.
Luís de Sequeira Oliva, que escreveu a peça em 1809, era então um dos autores mais fecundos da literatura patriota que na época proliferaram em Portugal, e baseou-se nesta revolta concreta de Olhão, talvez pelas razões expressas numa outra sua obra: “Os habitantes desta para sempre memorável população de pescadores não só tiveram a glória de serem os primeiros que sacudiram o tirânico jugo dos franceses em Portugal, mas a outra não menor de serem os primeiros que, embarcados num frágil esquife, afrontando as procelosas vagas do Atlântico, foram ao Rio de Janeiro noticiar ao nosso amado Príncipe a feliz Restauração de Portugal nos Algarves. Estes sim, são verdadeiros descendentes dos Gamas e Albuquerques”. 
Mais do que uma obra literária importante, é sobretudo um documento histórico muito interessante para fazer a análise da revolta algarvia, nomeadamente a importância mediática que esta revolta teve no País, a existência da censura que tentava esconder os colaboracionismos de alguns portugueses de nomeada, e o protagonismo da mulher olhanense na revolta.
A apresentação será feita pela APOS (António Paula Brito) e com algumas cenas recriados pelos jovens do projecto teatral Bom Sucesso (MOJU), dirigidos pelo actor Fernando Cabral.

Aclamação do Príncipe Regente em Braga (8 de Junho de 1808)


O Arcebispo de Braga, D. José da Costa Torres, sabendo por um expresso, no dia 8 de Junho, que os espanhóis tinham prendido na vila de Viana [do Castelo] alguns franceses que aí se achavam, e constando-lhe quase ao mesmo tempo da prisão dos do Porto, mandou imediatamente descobrir as Armas Reais no paço arquiepiscopal, e passou ordem à igreja primacial para se restituir na missa a colecta pelo Príncipe Regente e mais pessoas da Real Família. Houveram patriotas zelosos que, animados pelo exemplo do Arcebispo, fizeram soar instantaneamente pela cidade as vozes da aclamação: o clero especialmente as repetia e propagava com ardor; mas também houve um pequeno partido que se lhes opôs, composto ou de portugueses degenerados ou de espíritos fracos e vacilantes, o que quanto aos efeitos vale o mesmo; e chegando entretanto a notícia de que no Porto se havia retrocedido, também ficou tudo paralisado em Braga. 
O Arcebispo não retrocedeu, porque a fidelidade é nele a toda a prova, e constância uma das virtudes que lhe conheço por experiência. Devo este testemunho a um prelado respeitável de quem recebi as lições na Universidade no último ano, que ocupou a cadeira de História Eclesiástica, e cujo exemplar comportamento é bem patente a todos os que o conhecem. Ele porém esteve em perigo, porque o partido oposto tentou perdê-lo, procurando atestados e formando queixas contra ele ao intruso Junot, que não deixaria de vingar, se pudesse, este ultraje ao seu governo. A aclamação formal em Braga ficou demorada até 20.

[Fonte: José Accursio das Neves, Historia Geral da Invasão dos Francezes em Portugal, e da Restauração deste Reino - Tomo III, Lisboa, Officina de Simão Thaddeo Ferreira, 1811, pp. 124-126].



Carta do General Castaños, Comandante das tropas da Andaluzia, ao General Dalrymple, Governador de Gibraltar (8 de Junho de 1808)



Excelentíssimo e caro Senhor: 


Na cidade de Sevilha foi erigida uma Junta Suprema de Governo dos quatro Reinos da Andaluzia, que, representando a Majestade do Sr. D. Fernando VII, nosso único e legítimo soberano, começou a ditar aquelas providências enérgicas que são exigidas pelas críticas circunstâncias em que se acha a nação espanhola e a justa causa da sua defesa. A mesma Junta comunicou-me as suas superiores instruções, que foram trazidas pelo Primeiro Secretário dela [D. Juan Bautista Esteller], que irá a essa praça [de Gibraltar] acompanhado do meu Primeiro Ajudante, D. Joaquin Navarro, para em nome daquela autoridade soberana tratar com V.ª Ex.ª assuntos da maior importância, cujo imediato e favorável acordo espero encontrarem em V.ª Ex.ª, que em distintas circunstâncias me tem manifestado apoio. 
Reitero a V.ª Ex.ª os meus respeitos com os sinceros sentimentos que professo à sua pessoa, cuja vida guarde Deus muitos anos. 
Quartel-General de Algeciras, 8 de Junho de 1808. 
[...] 


[Fonte: Memoir, written by General Sir Hew Dalrymple, Bart., of his proceedings as connected with the affairs of Spain, and the commencement of the Peninsular War, London, Thomas and William Bone Strand., 1830, p. 146 (tradução nossa do original espanhol)].


Notícia sobre a chegada à Inglaterra de dois emissários da Junta das Astúrias (8 de Junho de 1808)




[Londres,] Quarta-feira, 8 de Junho. 


Às 7 horas da manhã vieram ao Almirantado dois fidalgos espanhóis, o Visconde Matarrosa* e D. Diego de la Vega, acompanhados pelo Capitão Hill, vindos de Espanha num navio armado em guerra denominado Stag, e desembarcaram em Falmouth; tendo vindo para bordo daquele navio num bote que os tomou em Gijón, na província das Astúrias. Ofereceram 500 guinéus pela passagem para Inglaterra e a inteligência que trouxeram é de grande importância: estavam em Madrid quando houve o levantamento a 2 de Maio, dizem que mataram 4.000 franceses, compreendendo muitos Oficiais. Intentaram fugir depois do levantamento, apressaram-se em vir para a província das Astúrias, a qual deixaram em 30 de Maio. Afirmam que em toda a Espanha reina o espírito de indignação contra os franceses, mas muito principalmente nas províncias das Astúrias e Galiza; esta última está num estado de levantamento tal que até as mulheres, esquecendo-se da timidez e delicadeza do seu sexo, animam os homens com vozes e exemplo a tomarem armas contra os invasores. Toda a província das Astúrias se vai levantando, e já tem em pé um Exército de 40.000 homens. 
Não há falta de armas mas sim de munições, o que nós esperamos [que] lhes seja imediatamente fornecido pelo nosso Governo. Astúrias deu o exemplo de resistência e despachou comissários à Galiza convidando o povo a levantar-se de concerto com eles. 
Mr. Hunter, cônsul britânico, foi preso por ordem de Murat em Madrid, e mandado para Santander para ali ser lançado numa prisão, mas o povo que aí se levantou imediatamente o libertaram, pondo o cônsul francês em seu lugar na prisão. Então se proclamou a declaração de guerra contra os franceses em Santader. 
Estes fidalgos dizem que não duvidam que a Biscaia e Catalunha já tenha seguido o exemplo das Astúrias e Galiza, e que em breve tempo toda a Espanha esteja contra os franceses. Não trouxeram inteligência alguma de Cádis, nem o Governo a recebeu. Tal é a narração destes dois fidalgos de distinção de grande honra. 
Não se pode duvidar que este país tem agora ocasião de poder fazer alguma coisa. Pensamos que não será impolítico oferecer à Espanha todo o socorro que estiver em nosso poder, publicando a nossa vontade de fazer paz com eles, declarando que não pretendemos opormo-nos ao seu Governo interno, e que o nosso único objecto é concorrer para eles se libertarem da tirania da França. E apesar de qualquer oposição e de nos dizerem que os irlandeses católicos que estão em Cádis hão de evitar que os espanhóis aceitem as ofertas do nosso Governo, nós estamos certos que eles se fiarão em quaisquer promessas do Governo inglês. 

[Fonte: Não conseguimos encontrar a versão original desta notícia, provavelmente publicada em algum periódico inglês da época. A versão acima transcrita deriva dum manuscrito disponível no Arquivo Histórico Militar: 1.ª div., sec. 14, cx. 287, doc. 09, fls 3-4; o Correio Braziliense de Junho de 1808 também publicou (na p. 78) uma notícia do mesmo teor].


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Nota: 

* Tratava-se de José María Queipo de Llano, nomeado vogal da Junta Geral das Astúrias. Ficaria futuramente mais conhecido por Conde de Toreno, título com que assinou os cinco volumes da sua Historia del levantamiento, guerra y revolución de España (publicada originalmente em 1832).



Carta do Capitão John Hill ao Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, George Canning, sobre a chegada à Inglaterra de dois emissários da Junta das Astúrias (8 de Junho de 1808)


O Capitão Hill, comandante do navio de guerra de Sua Majestade Humber, era o oficial de maior graduação no porto de Falmouth quando o nobre espanhol e o seu acompanhante D. Andrés de la Vega ali aportaram na segunda feira passada, dia 6 de Junho, vindos a bordo do corsário inglês Stag de Jersey, a cujo patrão pagaram 500 guinéus. Depois de declarar guerra aos franceses, a província das Astúrias outorgou plenos poderes a estes cavalheiros para negociarem com o nosso Governo; eles são também portadores duma carta destinada ao Rei de Inglaterra. O Visconde Matarrosa informa o Capitão Hill que saiu de Gijón, nas Astúrias, a 30 de Maio passado, embarcado numa lancha, e subiu depois a bordo do corsário acima indicado. Diz ainda que a província de León e Santader também declararam guerra à França, e que pensa que a maioria das outras províncias as seguirão. O Visconde estava em Madrid aquando da insurreição [de 2 de Maio] e ali ficou até o dia 9 de Maio, quando a mesma já tinha sido sufocada, embora os franceses tenham perdido cerca de 4.000 homens e um vasto número de oficiais [atingidos a tiros pelos espanhóis] das janelas [das suas casas]. Ele também disse que que mr. Hunter, o cônsul inglês, estava em Santander por ordens de Murat, e que o povo de Santander tinha libertado mr. Hunter e prendido o cônsul francês. O Visconde é parente do Almirante espanhol que comanda a esquadra em Minorca, e o Almirante é natural das Astúrias. Dado que o administrador da alfândega em Falmouth, que actua ali como agente dos estrangeiros, não tinha autoridade para deixar estes cavalheiros dirigirem-se para Londres, o Capitão Hill, sendo o oficial de maior graduação no porto, assumiu a responsabilidade de se encarregar destes cavalheiros, e trouxe-os para Londres com os seus ofícios, tão rápido quanto foi possível. O Capitão Hill pensa que o ele fez merecerá a aprovação do Muito Honorável mr. Canning, Primeiro Secretário de Estado de Sua Majestade.
Londres, 8 de Junho.

John Hill

[Fonte: Alicia Laspra Rodríguez, "La llegada a Inglaterra de los comisionaos asturianos nel 1808: un documentu inéditu", in [revista] Asturies: Memoria encesa d'un pais, n.º 3, Fundación Belenos, Xunu de 1997].


Excerto de uma notícia publicada no órgão de imprensa da Junta Suprema de Sevilha (8 de Junho de 1808)




Sevilha, 8 de Junho 



É incrível o ardor militar que se observa nesta capital e nas povoações da sua comarca. Estas apressam-se a enviar fundos e gentes que, capitaneadas sob as suas bandeiras particulares, apressam-se a oferecer a esta Suprema Junta a sua obediência e valor. Cada dia vão entrando novas tropas do campo de San Roque e Cádis, as quais se destinam imediatamente aos pontos da fronteira e ao reforço da vanguarda. Não só se completam os regimentos veteranos com gente valorosa, mas também se criaram cinco novos de infantaria […]. Todos estão bem providos de armas; e tanto destas como das demais munições e apetrechos fazem-se contínuas remessas a todos os pontos. Apesar do muito consumo destes artigos, os nossos arsenais, armarias e armazéns podem prover a outro exército, constando o nosso ao presente de mais de 60.000 combatentes. No curtíssimo tempo de exercícios militares que têm os soldados do novo alistamento, foram feitos progressos que causam admiração aos veteranos, e que parecerão incríveis aos que não conheçam os efeitos portentosos do patriotismo, sendo de esperar que cada dia ganhem maior incremento as nossas forças, de modo que assegurem os desejos da pátria. 
Devido ao facto de se ter apresentado uma divisão francesa em Castro Marim nos Algarves, mandaram-se reforços a Ayamonte, e ordem para armar e abastecer de munições as povoações do Guadiana, para a eventualidade, muito pouco provável, dos inimigos tentarem vadeá-lo. 
Numa carta de Madrid, datada de 31 de Maio, destinada a um Oficial desta cidade, diz-se que o Duque de Berg se encontra enfermo, e que pediu tropas a Napolão e ao General Junot de Portugal, sem que nem um nem outro se encontrem em disposição de poder mandá-las. O descontentamento das tropas inimigas parece geral, e corria um boato muito válido, segundo o qual em Bayonne havia uma insurreição e que o Imperador estava oculto, acrescentando alguns que ademais se encontrava ferido. Diz-se que em Paris há movimentos iguais, e que o Imperador da Rússia estava a ponto de concluir uma paz separada com o Rei da Suécia. Assim que tenhamos notícias oficiais de tão importantes acontecimentos, apressaremo-nos a dá-las ao público. 
[…] 


[Fonte: Gazeta Ministerial de Sevilla, n.º 3, en la Imprenta de la viuda de Hidalgo y Sobrino, 8 de junio de 1808, pp. 22-23].