quarta-feira, 20 de julho de 2011

Caricatura alusiva à incapacidade de Murat desbaratar os bandos de insurgentes espanhóis



Ainda que não esteja datada, julgamos que esta gravura foi concebida na sequência das notícias sobre a enfermidade de Murat, que começaram a circular em meados de Julho de 1808.

Notícia publicada na Gazeta Ministerial de Sevilla sobre o estado de saúde do Grão-Duque de Berg (20 de Julho de 1808)



Através de uma carta fidedigna sabe-se que o Grão-Duque de Berg chegou no dia 3 de Julho a Aranda de Duero, muito doente; devia sair na manhã do dia 4, mas o mau estado da sua saúde só lhe permitiu fazê-lo na tarde do dia 5; é levado de maca, por não poder andar de outro modo; cuja notícia se confirma por outros documentos autênticos.

[Fonte: Gazeta Ministerial de Sevilla, n.º 15, 20 de julio de 1808, p. 120].

Lista definitiva dos diferentes Corpos, Generais e Oficias do Estado-Maior que compunham o Exército Britânico destinado para a Península Ibérica, sob o comando do General Dalrymple (20 de Julho de 1808)




The Noble Spaniards, or Britannia assisting the cause of Freedom all over the World, whither Friend or Foe!, caricatura de Isaac Cruikshank (20 de Julho de 1808)



Os Nobres espanhóis, 
ou Britânia auxiliando a causa da liberdade em todo o mundo, seja amigo ou inimigo!
Caricatura de Isaac Cruikshank, publicada a 20 de Julho de 1808.


Um "oficial" espanhol com uma mitra adornada com um cocar, de espada erguida e com uma bandeira dizendo Fernando VII - Liberdade ou Morte, olha para a espécie de procissão que o segue. Atrás dele, dois nobres espanhóis, com as suas mãos direitas sobre os seus corações, portam as suas espingardas, secundados por outros dois porta-bandeiras, que arvoram os dizeres Vox Populi Vox Dei ("a voz do povo [é] a voz de Deus") e Não à tirania francesa. Mais atrás, seguem-se vários populares armados com chuços e forquilhas e vivandeiras com provisões. Entre esta "vanguarda" e a retaguarda pode-se ainda ver dois frades, ambos armados com espingardas.
Ao lado do líder destas "tropas irregulares" encontra-se um gato que mia por Murat (Mew Rat*) enquanto caça um dos vários ratos que fogem à sua frente, todos eles com um cocares tricolores... Acima dos espanhóis a legenda diz que um galante espanhol nunca se submeterá a ser governado pelo irmão de um macaco
Finalmente, no canto superior esquerdo, sobre as nuvens, aparece a personificação da Grã-Bretanha, que lança sobre o solo espanhol, através da sua cornucópia, canhões, espingardas, pistolas, espadas, munições, chuços, dizendo que a nação que tem espírito para se libertar do jugo do tirano da Europa, é nesse momento uma aliada da Grã-Bretanha**

____________________________________________________________

Notas:

* O trocadilho Mew Rat (que na fonética inglesa se aproxima bastante à pronunciação de Murat em francês) permite múltiplas leituras, dada a diversidade de significados dos termos que o compõem:

Mew: miado ou gaiola (substantivos); miar, confinar, encarcerar, engaiolar (verbos).
Rat: rato, canalha, guincho (substantivos); caçar ou apanhar ratos (verbos).

Deve-se ainda notar que esta mesma expressão (aludindo precisamente a Murat) já tinha aparecido numa caricatura anterior, atribuída a Charles Williams e publicada em Fevereiro de 1807, intitulada The Battle of Pul-Tusk, se bem que nesta última Murat fosse representado com cabeça de gato (com as inscrições Mew no seu colarinho e Rat na sua cintura).
Ver ainda a este respeito a caricatura intitulada Spanish Patriots entring [sicMadrid, or the Grand Duke of Bergs retreat discovered, publicada a 14 de Julho de 1808.



*Esta frase é inspirada num trecho dum discurso sobre os assuntos espanhóis pronunciado a 15 de Junho de 1808, na Casa dos Comuns, por George Canning, secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros da Grã-Bretanha: 

Devemos agir sobre o princípio de que torna-se instantaneamente nossa aliada essencial, independentemente de quais forem as relações políticas existentes com a Grã-Bretanha, qualquer nação da Europa que começar a determinar-se contra um poder que, professando uma paz insidiosa ou declarando guerra aberta, é o inimigo comum de todas as nações. 
[Fonte: The Parliamentary Debates from the year 1803 to the present time - Vol. XI (Comprising the period from the eleventh day of April to the fourth day of July 1808), London, 1812, pp. 889-891,pp. 890-891]. 

_______________________________________________________________

Outra digitalização desta caricatura:


Edital da Junta do Porto reabrindo os processos de justiça que se tinham mandado suspender a 26 de Junho (20 de Julho de 1808)

Edital da Junta do Porto levantando o sequestro dos haveres pertencentes a britânicos e determinando o sequestro dos haveres pertencentes a franceses (20 de Julho de 1808)

Edital da Junta do Porto ordenando que se reunissem aos seus respectivos regimentos os oficiais que ainda não o tivessem feito (20 de Julho de 1808)






Notícias publicadas na Gazeta de Lisboa (20 de Julho de 1808)



Lisboa, 20 de Julho


Anunciam diversas cartas de Badajoz e seus arredores que era ali mui vivo o desassossego entre os chefes dos rebeldes, por terem recebido de Madrid a notícia de que um corpo de tropas francesas se adiantava para aquela vila, a fim de dar auxílio ao exército de Portugal. Este boato, apesar do cuidado com que se procurava encobri-lo, transpirou entre o povo, o qual clamava já que se via cercado e entre dois fogos, o que não pode deixar de acontecer-lhe, mais cedo ou mais tarde. Algumas pessoas chegavam a dizer que o dito corpo se tinha já avistado nos contornos de Trujillo. 

Alguns indivíduos, em violação do decreto do Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor Duque de Abrantes em data de 5 de Abril, persistiam em manter comunicação com a esquadra inglesa; e outros, em levar-lhe mantimentos. Por vezes se lhes advertiu, com ameaça, que pusessem termo a um tráfico tão criminoso e tão arriscado, a não quererem expor-se às penas as mais severas; prevaleceu porém o engodo de um lucro miserável. Conseguintemente, 4 dos ditos indivíduos foram presos na Trafaria, ao tempo que voltavam; e não puderam negar o seu delito. Outros indivíduos do mesmo género existem na outra margem do Tejo; mas são conhecidos, e sobre eles se vigia, de maneira que tampouco poderão escapar, se continuarem a proceder assim. Em breve se deve decidir, de um modo exemplar, a sorte dos que já estão presos.

Como é melhor atalhar o mal que puni-lo, cumpre dar a saber aos inventores de fábulas absurdas e aos distribuidores de notícias extravagantes que algumas das lojas de bebidas que lhes serviam de ponto de reunião se mandaram fechar, os dias passados, por não haverem [os] seus donos tido a resolução nem de fazê-los calar nas conversações em que ali entravam, nem de ir denunciá-los à polícia, segundo a ordem que para isso tinham, e como o fazem prudentemente vários outros.
Também foram chamados alguns dos que espalham imposturas nas sociedades e nos lugares públicos, uns para serem admoestados severamente, e outros para estarem alguns dias reclusos nos cárceres da Inquisição que foi, a fim de aprenderem ali a haver-se com mais reserva tanto nas conversações como nas suas correspondências com os países inimigos ou revoltados.
Ninguém por certo deve ser responsável pelo conteúdo das cartas que recebe, ainda quando cheguem por vias clandestinas, se bem que então se fazem naturalmente suspeitas. Pode-se porém evadir este inconveniente com facilidade, e ficar livre de toda a exprobração, indo sinceramente comunicar à Autoridade competente as cartas que chegam, ou seja de países inimigos ou de partes momentaneamente revoltadas, quando anunciam alguma coisa que interesse o Governo.

Era de notar, havia já algum tempo, que as bandeiras ou estandartes postos nesta cidade às portas de certas tavernas, estanques ou lojas de bebidas, se multiplicavam mais que de costume; e que em algumas partes se variavam as cores destas insígnias de um modo tão equívoco que podia indicar lugares de maus ajuntamentos ou ainda de prostituição.
Portanto, os Corregedores e Juízes do Crime dos 13 bairros de Lisboa foram encarregados de mandar logo tirar os ditos estandartes, que são pelo menos inúteis, pois que as inscrições pintadas e escritas sobre as portas das lojas para designar o seu objecto bastam em todos os países. Aqueles que, 48 horas depois da ordem do Comissário do bairro, não tiverem feito desaparecer as ditas insígnias de que a malevolência poderia tirar partido para convocar os seus cúmplices, serão punidos: a primeira vez por uma multa, e a segunda, mandando-se fechar a casa onde se tiver cometido a contravenção.

Por uma Ordenança de Polícia publicada com data de 9 de Abril [...] passado, se tinha proibido que se deixasse vagar pelas ruas ou praças públicas boi ou vaca alguma que não fosse conduzida seguramente, de sorte que ficasse atalhado todo o desastre. Por 2 dias sucessivos, porém, escaparam e se introduziram nas ruas algumas vacas bravas que, decorrendo a praça do Rossio, fizeram com que corresse risco a seguridade dos pacíficos cidadãos que por ali passeavam. Uma delas até feriu perigosamente um indivíduo. Portanto foi apanhada de ordem do Senhor Conselheiro do Governo, Intendente Geral da Polícia do Reino; entregue aos soldados franceses e portugueses dos dois postos que concorreram para ter mão nela, e vendida logo por eles em seu benefício.
É de esperar que este exemplo, que não será o único, se as mesmas contravenções se renovarem, coíba aqueles que estão no hábito de deixar o seu gado andar errante pelas ruas de Lisboa.

[Fonte: 1.º Supplemento à Gazeta de Lisboa, n.º 28, 20 de Julho de 1808].